segunda-feira, 26 de março de 2007

Inesquecível

. "Pobrezinhos, mas honrados", não foi assim que nos ensinaram? Uma sardinha a dividir por seis, quem tinha sorte era quem ficava com a cabeça! Ah, e as sopas de cavalo cansado, a animar os meninos e as meninas antes da Escola?.. Belos tempos...
. A taxa de analfabetismo em Portugal é de 9%, ou seja, quase um milhão de portugueses são analfabetos. Portugal apresenta um elevadíssimo nível de iliteracia funcional que abrange 48% da população entre os 16 e os 65 anos de idade. Logo após a instauração da ditadura militar, o Decreto-lei nº 12425 de 2 de Outubro de 1926 reduzia a escolaridade obrigatória para 3 anos, alertando para os malefícios de um suposto excesso de instrução: “Atalhe-se a indigestão intelectual” – dizia-se – “ensine-se menos para se saber mais”. Recorde-se que a escolaridade obrigatória de 4 anos implementada pela I República, só meio século depois, em 1964, é ampliada para os 6 anos, e só nessa altura se torna obrigatória para os dois sexos. Antes disso, claro, não havia necessidade de mandar as meninas à escola. Elas seriam esposas e mães, nunca profissionais.
. A política externa do Estado Novo foi também brilhante: do equilíbrio peninsular medieval passa-se a um desequilíbrio peninsular. A primeira tomada de posição em matéria de política externa data de 1935 (quase 10 anos depois da implantação do regime), com a crítica ao parlamentarismo internacional do SDN que considera o centro político continental e em contraponto a afirmação da vocação atlântica de Portugal e o alheamento português das questões centro-europeias; a revalorização dos princípios tradicionais de política externa portuguesa com a reafirmação da Aliança Inglesa e da Amizade Peninsular; e finalmente a defesa intransigente do Império Colonial. E serão essas mesmas constantes históricas e linhas de orientação estratégica que persistem no pós Guerra e presidem às posições internacionais de Salazar que parece não compreender ou pelo menos não aceitar a emergência de uma nova ordem internacional. Em primeiro lugar, o declínio da Grã Bretanha e a emergência dos Estados Unidos da América como nova potência marítima que só vem a reconhecer com a estrada na NATO. Em segundo lugar, a desconfiança que tivera em relação ao assembleirismo de SDN volta a manifestar-se em relação à ONU como nova a organização internacional de vocação mundilal. Em terceiro lugar, não compreende que a reconstrução da Europa não podia mais fazer-se num quadro nacional e que teria que fazer-se, necessariamente, num quadro de cooperação internacional. Finalmente não compreende e não aceita o princípio e o direito dos povos a disporem de si próprios, dominante na Assembleia Geral da ONU, e recusa liminarmente a descolonização.
. A propósito de descolonização... Foram 9.196 mortos, entre 1958 e 1975: ÍNDIA - 8 mortos, CABO VERDE - 6 mortos, GUINÉ - 2.339 mortos, MOÇAMBIQUE - 3.015 mortos, ANGOLA - 3.828 mortos. Filhos/as que nunca conheceram os pais, pais que nunca puderam enterrar os filhos.
. Palavras de João Faria Borda (já falecido), um homem que passou dezasseis anos e três meses no Campo de Concentração do Tarrafal, que foi uma das mais sinistras criações do regime a que o 25 de Abril de 1974 pôs termo (in http://a_verdade_da_mentira.weblog.com.pt/ arquivo/097809.html):

«O campo de concentração era um rectângulo (cerca de 250m por 180) situado num dos sítios mais insalubres do arquipélago de Cabo Verde. Como alojamento existiam umas barracas de lona onde eram metidos cerca de 12 presos em cada uma. As casas de banho não existiam. Havia apenas uns sanitários – toscos muros de tijolo com uns buracos no chão e umas latas de gasolina para as necessidades. Como cozinha existia um telheiro com uns muros por onde a poeira entrava aos montes. Dois indígenas faziam a comida. A alimentação era péssima – havia ocasiões em que era necessário pôr bolas de algodão no nariz pois o cheiro da comida impedia que ela entrasse no estômago. Não havia água potável. Só existia água num poço a cerca de oitocentos metros do campo, água salobra que os presos transportavam em latas de gasolina. Mesmo assim era má e em pequena quantidade, não chegando para a higiene. Tomava-se banho com um único litro de água despejada de uma lata onde eram feitos uns buracos para o efeito.»
«O primeiro director do Tarrafal foi Manuel Martins dos Reis, capitão gatuno e paranóico, vindo da Fortaleza de Angra do Heroísmo. Este director “entretinha-se” a roubar as coisas que os familiares dos presos, com sacrifício, mandavam, desculpando-se que tudo aquilo era enviado pelo Socorro da Marinha Internacional. Chegou mesmo a montar uma pseudo cantina onde vendia as coisas roubadas.
Mal desembarcámos começámos imediatamente a trabalhar. Transportávamos pedras, sob vigilância constante dos guardas. Em Cabo Verde, região de clima variável, calhou chover bastante nesses anos. A lona das barracas apodreceu de tal maneira que lá dentro chovia como na rua e de manhã acordávamos com a cara negra da poeira que se pegava à humidade que sobre nós caía. As águas acumuladas formavam pântanos onde se desenvolviam mosquitos transmissores do paludismo. A saúde de todos nós, presos, arruinava-se. Caíamos atacados da doença chamada biliose. Sem fornecimento de medicamentos e com um médico que era um patife da pior espécie, em poucos dias morreram sete camaradas. Em cerca de uma média de 200 presos era vulgar, em certas alturas, apenas dez andarem a pé.»
«Os escândalos da actuação do primeiro director levaram à demissão deste. Foi substituído por João da Silva, acompanhado pelo fascista Seixas. Estávamos em 1938/39. A guerra civil espanhola terminava com a vitória do fascismo. O ditador português Salazar tinha contribuído, apoiando com o envio de géneros alimentícios e de homens, os quais ficaram conhecidos pelos Viriatos. Hitler tinha subido ao poder em 1933. Na Itália existia Mussolini. A situação no campo do Tarrafal, reflexo da situação política internacional caracterizada pela ascensão do fascismo, agrava-se terrivelmente. João da Silva dizia frequentemente: “Quem está aqui é para morrer!”. Com este director começou a funcionar sistematicamente a célebre tortura conhecida por “frigideira”. Todos os dias eram para lá atirados presos e eu também por lá passei algumas vezes.»
Acho que vou emigrar...

domingo, 11 de março de 2007

Às vezes...

... dou por mim tão tensa, que tenho os ombros encolhidos até às orelhas.

... dou por mim tão cheia de trabalho, que chego ao fim do dia e nem me lembro de como passou todo aquele tempo desde que acordei. É como se tivesse passado o dia em piloto-automático.

... dou por mim, já deitada, a pensar em tudo aquilo que me espera no dia seguinte, e sinto uma moínha no estômago.

... dou por mim tão cansada, que nem consigo dormir. E, quando finalmente consigo, passo a noite a acordar.


São dores de crescimento.