segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

A minha vida num postal ilustrado

A primeira vez que visitei o Porto, devia ter uns 11 anos. Detestei. Naquela altura, os meus pais tinham o hábito de fazer viagens do estilo "vá para fora cá dentro", e confesso que devo conhecer mais de Portugal do que alguma vez imaginei ser possível (ou desejei). Só para dar uma ideia, houve um fim-de-semana em que a viagem teve como destino Freixo de Espada à Cinta, simplesmente porque o meu pai achou piada ao nome da terra (com todo o respeito pelos/as Freixo-de-espada-à-cintenses, a piada fica-se mesmo pelo nome...). Naquela altura, por todas as razões e mais algumas, a última coisa que queria na vida era passar um fim-de-semana enfiada no carro, com os meus pais e a minha irmã, rumo ao Sítio onde o Diabo Perdeu as Botas, onde, normalmente, só se chegava por meio de alguma estrada serrana serpenteante.
Não sei bem por quê, se seria do dia cinzento, de haver pouca gente na rua, ou de termos ido parar a um sítio onde um esgoto enorme abria directamente para o areal da praia, mas fiquei com péssima impressão do Porto, e passou a ser um dos meus ódios de estimação. Convenhamos que eu, como jovem ribatejana da década de 90 que se prezasse, vivia (ou sonhava viver) a utopia alfacinha. Lisboa era aquela cidade onde íamos fazer coisas importantes, "ir a Lisboa" era sempre um acontecimento e poder dizer de uma peça de roupa "comprei em Lisboa" era como dizer "comprei em Milão". Era para lá que previa ir estudar, assim que pudesse pôr Santarém "para trás das costas", como se costuma dizer. E assim foi, 18 anos acabados de fazer, lá fui eu habitar um apartamento na Avenida do Brasil (para quem não sabe, é a rua do LNEC e, mais importante, do Hospital Júlio de Matos).
Quis o destino que a minha utopia alfacinha durasse pouco, e durante esse ano "abroad" fui amadurecendo a ideia de me mudar para o Porto, embora muito a contra-gosto. A razão para me mudar era boa (a melhor..!), mas a reticência em ir viver para uma cidade que me tinha desgostado tanto era muita...
Em Março, passam quatro anos e meio desde que a Invicta se tornou a minha cidade. Encho a boca para dizer que vivo no Porto. Sou capaz de maldizer o Inverno nesta terra, esta chuva crónica, este cinzento perpétuo, esta humidade que se agarra às paredes, ao cabelo, à roupa. Mas adoro o Porto. O Verão aqui é fantástico; quando saio do comboio em Santarém, em Junho, já não consigo respirar... Nunca vou deixar de ser scalabitana, e Santarém há-de sempre ser a minha terra, mas o Porto foi a cidade que eu escolhi para "construir" a minha vida, e quanto mais tempo passa, mais certa estou da minha decisão.
Para aqueles e aquelas que, morando no Porto, não o vivem; para aqueles e aquelas que, não morando no Porto, têm dele a imagem dos postais ilustrados; ou, finalmente, para aqueles e aquelas que, não conhecendo o Porto por dentro, têm dele apenas a imagem do granito enegrecido pela chuva, aqui fica a cidade onde vivo, em fatias de luz e côr, num fim de tarde de Inverno...











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