As pessoas que melhor nos fazem são aquelas que têm a capacidade de nos fazer sentir competentes e incompetentes, na(s) altura(s) certa(s). Tive essa experiência pela primeira vez quando tinha 14 anos. Tinha uma amiga e um amigo, ela pouco mais nova que eu, ele alguns anos mais velho, com quem partilhei muitas experiências significativas, que ainda hoje recordo, com embaraço e ternura, conforme a disposição.
Ela, sendo mais nova, era também menos experiente, em diversos aspectos da vida, e reconhecia-me competência, pedindo-me conselhos e desabafando as angústias próprias daquela idade da vida que pensamos nunca mais terminar. Muitas vezes nos sentávamos no quarto dela, manhãs e tardes dentro, despindo as convicções de meninas e vestindo as inseguranças de mulheres, e eu sentia-me sempre sábia, sempre capaz, sabia sempre o que dizer e quando, e a confiança dela em mim validava-me e ia-me permitindo novas vitórias.
Ele, sendo mais velho, relembrava-me constantemente (na maioria das vezes até inconscientemente, parece-me) da minha incompetência, desafiando-me, explorando as minhas fraquezas e desconstruíndo as minhas certezas, fazendo-me sentir excluída, obrigando-me a procurar novos lugares, novas brechas de entendimento e aceitação. Relativizava as minhas lágrimas, mas também os meus sorrisos, e perguntava-me sempre "porquê?".
Hoje, alguns anos depois, perdi quase completamente o contacto com estas duas pessoas, mas penso que elas são também um pouco daquilo que eu sou hoje, com as minhas competências e incompetências, e ainda bem que assim é: quero sempre saber e desconhecer, (des)construir e ser (des)construída, porque a vida é longa demais para passarmos por ela pensando, ou que já sabemos tudo, ou que nunca vamos conseguir nada...
Hoje, alguns anos depois, tenho na minha vida uma pessoa que concilia, na sua relação comigo, estes dois aspectos, e penso que essa é uma das chaves para que possamos continuar juntos, face às mais diversas vicissitudes: não tenho a ilusão de dizer que me completa, ou que é a minha outra metade, porque isso é sempre redutor. Posso apenas dizer que me faz sentir válida e inútil, e tem o entendimento necessário para me provocar estes sentimentos na altura certa, sem eu perceber muito bem como, e de me dizer, muitas vezes sem palavras, que já sou, mas posso ainda vir a ser muito mais. E não será isso também o amor...?
sábado, 20 de maio de 2006
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