terça-feira, 4 de julho de 2006

Frivolidades, ou Breve História Pessoal dos Ciclos da Moda

Chegaram ontem as minhas All-Stars novas, que encomendei via catálogo há algumas semanas atrás. São verdes (tipo tropa, ou, como diz no catálogo, "caqui"), assim meias a desfazerem-se nas costuras (no catálogo diz que é "acabamento em bruto"), têm atacadores beges e a borracha não é bem branca, é mais a atirar para o cinzento. Depois de largos meses a procurar resistir à moda das All-Stars, cheguei à conclusão de que gostava realmente e suficientemente das sapatilhas para comprar umas, e aproveitei uns saldos para ceder à tentação. Cheguei hoje à conclusão de que passaram dez anos desde que tinha comprado as últimas (e únicas, por sinal; eram também verdes, por curiosidade, mas não eram "vintage" como estas, eram o estilo normal), e debrucei-me a reflectir sobre os ciclos da moda, no que diz respeito à roupa/calçado/acessórios que utilizamos.
Quando eu estava mais ou menos a entrar na adolescência (13-14 anos), ressurgiu a moda das calças à-boca-de-sino e das calças pata-de-elefante (para quem não está familiarizado/a com este termo, refere-se àquelas calças que alargam logo a partir do meio da coxa, ao contrário das à-boca-de-sino, que alargam só a partir do joelho). Na altura, a minha mãe ficou encantada com este ressurgimento, e desatámos logo a reciclar as calças que ela própria usara há mais de 20 anos atrás. A minha mãe nasceu em 1960, portanto viveu a adolescência nos anos 70, e posso dizer que tive o privilégio de usar roupa genuinamente "vintage" (alguma dela ainda hoje uso, mas basicamente as túnicas e casacos, porque digamos que a adolescência tem muito que se lhe diga, e as calças já deixaram de me servir há muitos anos…), e sem ter de pagar exorbitâncias por isso (como agora se vê por tudo quanto é loja de marca, calças praticamente a desfazerem-se, de tão processadas, pela módica quantia de 30 ou 40 contos - ou mais, mas eu ainda sou "pobrezinha" demais para entrar sequer em lojas que vendam roupa acima desse preço...). Desde essa altura nunca mais consegui largar as calças à-boca-de-sino e pata-de-elefante, sou sua fiel adepta há quase 10 anos, realmente acho que são os cortes que me assentam melhor, mesmo agora que - diz-se por aí - já não se usa esse corte; ou seja, mais uma vez, já passou de moda. Parece que hoje a moda, no que a calças diz respeito, são as de corte direito, mais ajustadas, e se possível com a bainha virada para fora. Tenho de confessar de também já aderi, comprei as minhas na semana passada, já com vista à chegada das All-Stars, e a minha avó teve a amabilidade de me costurar umas bainhas bem "fashion", em zig-zag (a minha avó é a deusa da costura, salvé!). Já tinha experimentado vários modelos, em várias lojas, todas dentro desse estilo, e já estava praticamente convencida de que não servia para mim (o corpo tem destas coisas, não se adapta a todas as modas!... Ou, pelo menos, o meu…), até que fui à Bershka (a única loja onde ainda consigo comprar umas calças decentes por menos de 30 euros, e onde, de resto, compro sempre as calças, passo a publicidade...), onde já não ia há vários meses, e senti-me tão realizada por, finalmente, ao fim de tantas experimentações por tudo quanto é loja, encontrar umas calças que me caíam bem, que não resisti e acabei por comprar a calcinha da moda, com direito a bainha virada para fora e tudo!... Mas, de facto, devo estar a ficar muito antiga, porque aquilo na etiqueta dizia "cintura média" (por oposição a "cintura subida" e/ou "cintura descaída"), mas eu tenho que passar a vida a puxá-las discretamente para cima, porque aquilo é quase pornográfico; nem quero imaginar o que seria, na cabeça deles/as, designers de moda, umas calças de cintura descaída...
Quanto às calças justas também tenho qualquer coisa a dizer, como não poderia deixar de ser: é/foi uma moda, tanto quanto sei, vinda dos anos 80, emergente do fenómeno "punk", e pela qual também passei, mais ou menos por volta dos 10, 12 anos, embora nessa época a matriz punk já se tivesse mais ou menos dissolvido, e então havia-as de todas as cores; eu, pessoalmente, tive umas azul-celeste, umas beges, umas azul-escuro, umas castanhas e umas pretas (tanto quanto me lembro), justas como collants, mas as minhas preferidas eram de facto as pretas, usava-as imenso, ao ponto do meu pai me inventar a alcunha de "barrote queimado", quando me vestia de preto integral e pesava para aí 35 quilos… Devo ainda acrescentar que esse modelo de calças, elásticas e justíssimas, é em grande parte responsável por haver por aí tanta rapariga de 20 e poucos anos cheia de estrias nas coxas, porque aquilo era uma sentença de morte para a circulação sanguínea, eu própria sou prova viva disso, e doarei o meu corpo à ciência na altura propícia...
E então pronto, hoje lá saí à rua com as calças e as sapatilhas da moda, e, pelo sim, pelo não, uma t-shirt não muito curta, porque se há coisa que não gosto (nessa moda, garanto que não me apanham) é andar pela rua de cuecas à mostra, por mais bonitas (e/ou caras) que elas sejam!Quanto às All-Stars, razão primordial deste post, fizeram-me chegar à conclusão de que, realmente, o tempo passa a correr, e que estamos, de facto, numa era em que a informação corre à velocidade da luz: as calças à-boca-de-sino e pata-de-elefante, bem como as túnicas, demoraram mais de 20 anos a reentrar na moda, enquanto que não passaram ainda dez anos desde que as All-Stars "saíram de circulação", para já voltarem a entrar. O que hoje é moda, amanhã, ou o mais tardar para o ano, deixará de ser, e quanto mais o tempo passa, mais rápido será este fenómeno cíclico, porque de facto assim o é: alguém "inventa" uma moda, toda a gente (ou quase...) adere, quando se torna vulgar desaparece, para voltar a reaparecer alguns anos depois, quando alguém descobre a(s) dita(s) peça(s) remetidas para um qualquer fundo de baú, e se lembra da razão pela qual a(s) comprou em primeiro lugar: porque gostava dela(s), e não apenas porque estivesse(m) na moda... Sim, porque, na minha cabeça, no meu mundinho utópico, as pessoas ainda compram as coisas porque gostam delas, e porque se sentem genuinamente bem com elas, e não apenas porque a/o amigo/a também usa... É mais ou menos como os acessórios dourados e prateados (em ouro e prata genuínos ou a imitar, conforme as possibilidades de cada um/a), parece que agora estão outra vez “na berra”, e tanto quanto sei a primeira vez que foram moda foi no início dos anos 90, mais ou menos com a emergência do fenómeno “rap” e “hip-hop”. Aliás, lembrei-me no outro dia que tive umas sabrinas douradas, que inclusive usei no primeiro dia de aulas, quando entrei para a Escola Primária, tenho até várias fotografias com elas calçadas… Se soubesse o que sei hoje, e os meus pés não tivessem crescido estupidamente desde então, acho que as tinha guardado, porque isto uma pessoa nunca sabe…!




(foto retirada de www.shinkareff.ru)

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